Assisti somente em vídeo... er, dvd, há pouco tempo atrás. Lamentei não ter visto no cinema.
Não por qualquer razão visual em si, nem todo filme é Avatar: mas porque realmente é um filme muito bom, com uma história muito legal!
Baseado em uma História em Quadrinhos de mesmo nome (lançada pela Devir no Brasil), Os Substitutos se passa em um futuro próximo, onde próteses cibernéticas se aprimoraram a tal ponto que andróides completos guiados por telepresença substituem seus controladores no dia a dia em qualquer aspecto: do local de trabalho à uma rapidinha depois da boate.
E, como toda a boa história onde há um mundo perfeito, há um descontente.
Bruce Willys é um agente do FBI, passando por algumas crises de meia-idade: ao mesmo tempo em que sequer vê sua esposa em carne e osso sabe-se desde quando, sempre interagindo com ela através de seus substitutos, ele se questiona no que a sociedade se tornou: afinal de contas, as pessoas não têm mais que se arriscar, seus substitutos tomam todos os riscos, enquanto elas confortavelmente ficam em casa. É como se a vida via Internet – encontros virtuais, trabalho online, visitar outros países e lugares, etc. – ganhasse a rua: você não necessariamente é o que aparenta ser, e realmente ninguém está tão preocupado assim com isso. O filme tem grandes sacadas nesse ponto, e na minha opinião é onde realmente brilha. Como seria uma sociedade onde ninguém teria que se arriscar no dia a dia, com um grau de conforto material relativo e, como em um MMO – o mais autêntico Second Life? –, em caso de morte, com a ressurreição logo ali, adquirível na loja da esquina?
Devido ao conforto e à segurança, o filme parte do princípio em que a maioria dos crimes desce de maneira vertiginosa: até que um assassinato ocorre, e de maneira impensável, com a destruição de um substituto matando a quilômetros dali o seu piloto. E assim começa a história. Temos a investigação, que vai levar a uma grande conspiração, um mcguffin, um clímax... a coisa vai bem nos conformes. O clímax é interessante, envolvendo um “despertar planetário” – voltarei a isso mais abaixo.
Há uma cultura de descontentes, que vêem nos substitutos algo fundamentalmente errado, e ganham na justiça o direito de viver em “reservas”, como se fossem indígenas, livre da presença dos andróides. Não dá para simpatizar com eles: suas áreas são sujas, eles são feios (demais), tudo dá uma impressão de desorganização e desleixo – e violência e ignorância. Os modernos selvagens nada têm de nobre, mas de ignorantes e truculentos; acho que a idéia era mostrar algo entre o sobrevivencialista e o white trash típico americano. Curiosamente, veio à lembrança a reserva de Malpais em Admirável Mundo Novo, onde se viva fora do paraíso em condições semelhantes: não necessariamente há uma falta material que explique o desleixo.
Se o selvagem nada tem de nobre, entretanto, o ‘civilzado’ tampouco: termos pejorativos de intenções racistas são ditos aos que saem à rua sem seus substitutos, ao ponto em que ‘humano’ é dito como se fosse uma desvantagem. Casando com isto, há uma cena de Willys, tentando sair na rua já sem seu substituto, apenas para ser tomado por um princípio de pânico, com tanto espaço aberto e ao mesmo tempo tantos substitutos passando rapidamente por ele, esbarrando o tempo todo: se podemos pensar que isto seria uma falta de sintonia fina da movimentação das máquinas, há o grande contraste de um Bruce Willys cambaleante e inseguro, ferido, velho, sendo atropelado por uma beleza e perfeição que marcha e não se detém por ninguém. Não sei se era a intenção, mas achei uma ótima metáfora para a seleção natural. :)
Acima, falei do ‘despertar planetário’ do clímax do filme, ou seja, um evento onde, presumivelmente, toda a população humana passa por uma mesma situação, uma mesma experiência transformadora, independente da latitude ou da longitude em que se encontram: há algo parecido na série e no livro Flashforward, ou do estágio final de O Fim da Infância, de Arthur C. Clarke. Isto tem a ver com a decisão, ao final do filme, que Willys dá ao destino do mundo, logo após derrotar o vilão, que queria o fim dos substitutos para libertar a raça Humana, ao custo da vida de milhões de usuários. Willys, entretanto, tem o meio de poupar vidas, mas não o maquinário, e ele escolhe isto como sua visão de um mundo melhor: umas das cenas finais mostra pessoas de roupão, ou pijama, saindo de suas casas, inseguras, olhando para a rua do lado de fora com seus próprios olhos pela primeira vez em anos. Wall-E, alguém?
Embora capte perfeitamente a mensagem do filme, eu não sei se concordo plenamente com essa decisão: pessoas decidiram por conta própria viverem assim, afinal de contas. Por que alguém acha que pode julgar melhor a vida de milhões de pessoas? Claro que uma vida de conforto material excessivo estraga o ser humano como pessoa, disto eu entendo plenamente, e a tecnologia é apresentada como uma armadilha que docemente se fecha sobre a raça humana. Se não me engano, há textos de religiões orientais que falam da natureza ilusória do que se apresenta como realidade, o que escraviza o Homem. Este assunto foi abordado de forma mais literal pela trilogia The Matrix, por exemplo, o que deixa Os Substitutos com um certo grau de parentesco aqui. Entendo também que certas coisas, quanto mais se discute, menos se age, conclui ou principalmente renova... o descontente passa a ser o salvador de todos, embora muitos possam até se perguntar, “mas do que, mesmo?” :-)
Pelo menos, na onda de “Escolhidos Por Uma Força Maior”, Tom Greer é apenas um mero mortal, com a força de caráter de ir até o fundo de um crime, contra tudo e contra todos, homens e máquinas.
3 comentários:
Eu li a revista em quadrinho que deu origem ao filme (que não vi) e gostei muito!!! Deixei até um pequeno artigo no Mausoléu!
Pois é! Falta vc ver o filme e eu ler o quadrinho! :)
Achei este filme ótimo, com uma história muito bem bolada.
O diretor Jonatahn Mostow é bem competente.
Parece que o futuro será moldado pelo vício em informação e o hedonismo irresponsável.
Uma hq que mostra um futuro distópico assustador é Transmetropolitan, de Warren Ellis e Darick Robertson.
Até mais.
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